...na música, até o silêncio tem ritmo.

domingo, novembro 13, 2011

Quando gravou “Bianca”, em 1985, será que Egberto imaginava que ela seria a pianista que é hoje?

Pianos a serviço da música

Aquiles Reis



Flor de Abril (Delira Música) é o segundo CD do duo Gisbranco, integrado pelas pianistas Bianca Gismonti e Claudia Castelo Branco.

“Dança No 4”, de Heitor Villa-Lobos, dá início aos trabalhos. Os pianos impactam pela fortaleza, pelo vigor com que soam as notas, pela precisão com que encadeiam a levada. Não fosse ela elaborada pelo arranjo de Egberto Gismonti, a harmonia soa diferente da original. Mas para tornar o arranjo ainda mais carismático, ainda que a genialidade do craque continue latente, as pianistas adaptaram-no a seu modo e feição. Para transformá-lo em algo ainda mais buliçoso, convidaram Carlos Malta, seu pife e sua flauta, a fim de tocar e dividir a adaptação do arranjo.

Para fazer com que o piano soe batido, as mãos vão aos acordes como se quisessem impregná-los com sua aptidão. Encantadas, as teclas se amoldam e (cor)respondem aos desejos de Bianca e Claudia. Após os primeiros compassos tocados por elas, o pife surge quase tímido. A tensão aumenta. Vem a flauta e improvisa, os pianos centram para ela. Mas logo puxam para si o direito de voltar a ser protagonistas. A flauta toca notas graves. A batida segue solta, amalucada, como adoidada fica a flauta também... Brilhantes!

“Festa no Carmo” é homenagem de Bianca a Egberto Gismonti. Inspirada em temas já compostos por seu pai, ela cria o clima festivo dos forrobodós da cidadezinha do interior fluminense. Os pianos mantêm a fortaleza das cordas fortemente percutidas pelos martelos envoltos em feltro. Refletida na alegria da interpretação, a homenagem, principalmente no intermezzo, é feita de carinho e virtuosismo.

Além de seis faixas autorais, três de Claudia (uma com letra de Marcos Campello) e três de Bianca, o disco tem também cinco músicas de autores conhecidos, como é o caso de “Ponteio”, de Edu Lobo e Capinan. Com arranjo respeitoso, os pianos se esmeram em fidelidade à obra – o que só notabiliza o talento das pianistas. Talento que também aflora alentado em solos de extremo bom gosto. Encerrando o arranjo, elas cantam o refrão. Só que suas vozes não têm a mesma força de seus pianos... o que não chega a comprometer o trabalho, claro, mas não o engrandece.

“Flor de Abril” (Claudia Castelo Branco), que dá título ao CD, traz melodia suave, mas calorosa. A interpretação dos pianos tem o poder de lançar ainda mais lenha na fogueira sonora do Gisbranco.

Para encerrar, “Por Causa de um Ingresso do Festival, Matou Roqueira de Quinze Anos”, de Chico César – ele que canta junto com elas. Pianos enlouquecidos dão início ao baião. Logo surge a voz inconfundível de Chico. É o Nordeste dizendo presente. Os três seguem cantando com o apoio dos pianos. Para findar a musica e também o disco, a mixagem deixa soando um acorde do piano... Ele resta no ar como marca registrada do Gisbranco, pianos a serviço da música de qualidade.

PS. Quando gravou “Bianca”, em 1985, será que Egberto imaginava que ela seria a pianista que é hoje?


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