Goleada instrumental
Aquiles Reis
Após Choro Elétrico (2005) e Porta Aberta (2008), o Quatro a  Zero lança Alegria (com apoio do ProAC, do estado de São Paulo).  Integrado por Daniel Muller (piano e acordeom), Danilo Penteado (baixo  elétrico e acústico), Eduardo Lobo (guitarra e violão) e Lucas Casacio  (bateria), o grupo tem uma visão muito particular dos gêneros musicais  tidos e havidos como sendo “de antigamente”.
Tanto nas composições quanto nos arranjos, seus instrumentos soam  impregnados de uma concepção que se vale da tradição para ousar novas  formas de bem interpretá-la, com riqueza harmônica, suingue e melodias  contagiantes. O que resulta numa audição de raro prazer. Fato que a  presença para lá de especial do bandolinista Joel Nascimento, do  saxofonista Nailor Proveta e do baterista e percussionista Oscar Bolão  só faz acentuar.
 Na abertura, Nailor Proveta e seu saxofone soprano dão vida a “Papo  de Cozinha” (Proveta). A pisada é contagiante. O acordeom dá o ar de sua  graça. A bateria leva na caixa. O baixo segura as pontas. O acordeom  encabeça a melodia. O sax volta e “conversa” com o acordeom e o  contrabaixo. O bandolim pede vez... todos dão, claro! O sax retoma. A  bateria tem alguns compassos para solar. O maxixe segue e vai ao fim.
O piano começa, a guitarra assume e conduz “De Peroba-Rosa” (Daniel  Muller). O piano e o baixo chegam junto. A guitarra sola enquanto  bateria e baixo apoiam. Depois da guitarra, o piano puxa. O chorinho  volta firme nas cordas da guitarra. Dá para sentir o cheiro do café que  acabou de ser passado e está sobre o fogão, aguardando que o papo  arrefeça para ser tomado. E a guitarra e o piano trazem o papo para si –  todos param para ouvi-los dizer o que sentem. Empolgados, findam o  papo.
(Na verdade, o repertório é tocado como se os músicos, depois de um  tempo sem se ver, estivessem em torno de um fogão a lenha, cada um com  seu instrumento, loucos para prosear e mostrar um ao outro o que de  melhor sabem fazer).
A caixa da bateria, agora com Oscar Bolão, começa. O piano e o baixo  vão junto. O bandolim sente a pressão e se junta aos bons. Recomeça o  papo. O bandolim, nas mãos de Joel Nascimento, dedilha com as cordas  presas, o que aumenta o suingue e segue imprimindo brasilidade à  deliciosa “Dança de Urso” (Candinho). 
Em “Bacalhau ou Caipirinha?” (Eduardo Lobo), a guitarra e o piano  abrem. Logo a guitarra assume a melodia. O piano contribui para a  moderna sonoridade. E os dois demonstram que não há chance de algum  instrumento não ser adequado à tradição musical. Ora, a guitarra está  ali para dirimir qualquer dúvida que ainda possa existir. O piano e a  guitarra abdicam do ritmo e proseiam, mas logo deixam que a bateria e o  baixo os reconduza ao choro; aí tudo volta a balançar.
Suíte Retratos, de Radamés Gnatalli, é a comprovação da maturidade  musical dos meninos do Quatro a Zero. Diante de obras definitivas, seus  talentos emergem, pródigos. Ouvi-los aumenta a goleada musical. Show de  bola.

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