...na música, até o silêncio tem ritmo.

sábado, abril 07, 2012

Uma dessas pessoas, sem dúvida, é Thiago Marques Luiz – produtor useiro e vezeiro em reconduzir à tona quem dela nunca deveria ter saído. Assim ele fez, agora, com Milena.

De volta à música

Aquiles Reis
Natural de Juazeiro, terra das carrancas, no oásis do sertão baiano, a cantora Milena despontou para a música nos anos 1970. Ela faz parte de um razoável contingente de artistas que, apesar do grande talento, terminam ficando pela estrada, quase ou totalmente esquecidos. Para os que a ouviram e gostaram de sua voz e de seu repertório, restou sua ausência, tão injustificada quanto, digamos, misteriosa.

Eu disse “misteriosa”? Pois bem, vamos lá! O que determina o “esquecimento” de um artista? Ora, há os que não aguentam o rojão, desinteressam-se pela música e vão à depressão; há os que lutam denodadamente em busca de um espaço que os leve ao grande público, mas nunca chegam lá por falta da estrela que brilha para uns e se nega a outros...

Mas existem pessoas que se dedicam a trazer tais artistas de volta à música. São como anjos da guarda de talentos quase silenciados, mas que ainda têm muito a dar. Uma dessas pessoas, sem dúvida, é Thiago Marques Luiz – produtor useiro e vezeiro em reconduzir à tona quem dela nunca deveria ter saído. Assim ele fez, agora, com Milena.

Por onde passa a memória (Lua Music) é o novo cartão de visitas que ela, pelas mãos de Thiago (produção e concepção), volta a oferecer ao público, seja ele o que dela ainda se lembra, posto que nunca a esqueceu, seja ele o que nunca a ouviu, mas que, certamente, ficará encantado ao fazê-lo.

Num disco gravado carinhosamente, com sóbria direção musical e competentes arranjos e violões de Rovilson Pascoal, mais um considerável time de bons instrumentistas, Milena desfila sua voz condimentada no semiárido baiano e adoçada pelas águas do rio São Francisco.

Tudo isso deságua num repertório magistralmente escolhido. A mim agrada as canções lentas, quando o vozeirão de Milena se impõe com viço, frescor e sapiência. E sua afinação realça versos como os de “Quem Mandou” (Moacyr Luz e Hermínio Bello de Carvalho), ou como os de “Amora” (Renato Teixeira), “Os Grilos São Astros” (Rosinha de Valença) e “Depois de Tanto Amor” (Paulinho da Viola). Ou, ainda, os de “Aos Pedaços” (Sueli Costa e Abel Silva), “Azulão” (Heckel Tavares e Luiz Peixoto), “Caju em Flor” (João Donato e Ronaldo Bastos), “A Rua” (Gilberto Gil e Torquato Neto) e “Minha História” (João do Vale e Raimundo Evangelista).

Mas Milena também capricha nos temas mais ritmados, com letras igualmente muito fortes, quando suas divisões, seus graves e agudos são testados e aprovados: “A Estrada e o Violeiro” (Sydney Miller), “Defesa” (Mirabeau, Jorge Gonçalves e Vital de Oliveira), “Errei, Erramos” (Ataulfo Alves), com participação especial de Ataulfo Alves Jr., “Meu Romance” (J. Cascata), “Juazeiro” (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira) e, para fechar, “Eu Fiz Uma Viagem” (Dorival Caymmi).

O título desta música de Dorival, somado ao título do CD (“Por onde passa a memória”), ratifica o reencontro de Milena com o público: está refeita uma viagem de volta à sua e à nossa memória musical.


PS. Chico Anysio, Ademilde Fonseca e Millôr Fernandes se foram, meu Deus! Farão imensa falta. Sem três de seus maiores gênios, o Brasil fica mais pobre e sem graça.

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